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Breve análise do Livro de A. Lima; Do Papa Herege.

Mui engraçado é o livro de Alessandro Lima, O Papa Herege, considerado pelo Centro Dom Bosco e outros canais do movimento Reconhecer e Resistir como "o livro que refuta o sedevacantismo".


Todo o livro parte da premissa de que nós, sedevacantistas (totalistas), baseamos nosso argumento de que os Papas conciliares foram Papas verdadeiros, e que, então, caíram em heresia e perderam o pontificado, seguindo a opinião de São Roberto Belarmino. Contudo, nosso argumento é que um herege não pode ser eleito Papa e que, por isso, esses “Papas” conciliares nunca foram eleitos validamente como Papas verdadeiros. Todavia, concedi ao autor a suposição de que sua premissa está correta e, então, acompanhei o desenvolvimento de seu raciocínio no livro. Porém, o que encontrei foram argumentos que me fizeram rir, para não chorar.

 

Na maior parte do livro, encontrei vários equívocos e algumas interpretações erradas, principalmente sobre São Roberto Belarmino e outros Doutores da Igreja. Farei um vídeo ou artigo com uma análise do livro, se Deus o permitir. Veja, por exemplo, uma pequena amostra do que A. Lima escreve na página 163:

 

Pe. Mattheus Conte a Coronata ensinou o mesmo em seu décimo sétimo livro do século, Tractatus Postumus:

 

"Um Pontífice que caiu na heresia pode ser deposto com toda a justiça. Assim, Duvallius, acima em q.10. A razão é que não é credível que Cristo queira mantê-lo como Vigário de Sua Igreja, que persistentemente se segrega (segregat) inteiramente dela, uma vez que Cristo ordenou especialmente que Ela ouvisse Sua Voz como um povo fiel, e obedecer a Ele, assim como as ovelhas ouvem a voz do seu pastor. As ovelhas ouvem a Sua Voz e O seguem. As ovelhas O seguem (cf. João 10,3-4). Mas longe está que a Igreja ouça um Pontífice caído na heresia, Ela que é obrigada a tapar os próprios ouvidos contra o seu discurso violento, para não ser infectada pelo veneno da sua doutrina; [em vez disso] a sua expulsão e nova eleição deveriam ser incentivadas pela assembleia dos Sagrados Cardeais.” - Tractatus Postumus (Liège, 1677), Tract I, Capítulo XXI, n. II, p. 80-81, traduzido pelo Ir. Alexis Bugnolo. Grifos do A. Lima.

 

Pois bem, apesar de errar o nome do autor, que é Rev. Pe. Matthias de Corona (em latim, R. P. Matthiae a Corona), e não “Pe. Mattheus Conte a Coronata”, desconsiderarei e irei ao que A. Lima escreveu nessa parte; “a sua expulsão e nova eleição deveriam ser incentivadas pela assembleia dos Sagrados Cardeais”. Tal afirmação daria um bom argumento teológico para o movimento R&R e uma refutação tão desejada contra o sedevacantismo, segundo eles, não? Contudo, infelizmente, não foi dessa vez.

 

Veja o texto todo no latim original:

 

II. Pontifex in haeresim lapsus iustissimè deponi potest.  Ita Duvallius supr. quaest. 10.  Ratio est, quia non est credibile Christum velle eum suae Ecclesiam Vicarium retinere, qui se totum ab ea pertinaciter segregat, cum praesertim Christus ei mandaverit, ut populus fidelis vocem eius audiat, eique obtemperet, sicut oves pastoris sui vocem audiunt.  Ioannis cap. 10. vers. 3.  Oves vocem eius audiunt & eum sequuntur.  Vers. 4. Oves illum sequuntur.  At tantum abest ut Pontificem lapsum in haeresim Ecclesia debeat audire, eique parere, quin potius tenetur obturare aures suas loqui volenti, ne inficiatur veneno doctrinae eius, & eius deiectio ac nova electio a S. Cardinalium coetu urgeri debet.  Ratio est, cum enim Pontifex sit Ecclesiae fundamentum, petra, lapsis angularius, crepido, Doctor, & Pastor generalis, haec omnia privilegia haeresis abolet, & cassat, quia est detructor & dissipator Ecclesiae, & consequenter non est amplius Pontifix.  Vel si sit adhuc, donec fuerit iudicialiter haereticus denunciatus, statim a Pontificatu deturbandus est, si haeresis eius sit externa & manifesta per facti evidentiam, vel Concilii declarationem. Non autem si sit interna & mentalis tantum.  Ratio est quia non est amplius Ecclesiae membrum, nec caput, nec ei cohaeret unione interna, quae est per fidem, neque externa, quae est per fidei confessionem, & ab ea utroque modo praecisus est. Eandem poenam incurrit Pontifex schismaticus, ut post Turrecremata lib. 4. summae Ecclesiae parte 1. cap. r1.  Cajetanum 2. 2. q. 37. art. 1.  Docet Duvallius supra. Quaest. 9. quod scisma contrahere potest.  Primo, si nolit amplius fungi Pontificis officio, nec velit subesse ei, qui in suum locum eligeretur, sed se adiungeret Schismaticorum Conciliabulis.  Secundo, si antiquos ritus & consuetudines Ecclesiae ex traditione Apostolica manantes vellet immutare, seu potius si divelleret & separaret ab unitate Ecclesiae volentis has caeremonias retinere.  Tertio, si se ob iniustam causam separaret a communione totius Ecclesiae & omnium Episcoporum, & dumtaxat cum quibusdam sibi adhaerentibus vellet communicare, ut ex D. Cypriano libr. 4. epist. 2. faciebat Novatianus qui ideo Scismaticus, & extra gremium Ecclesiae passim ab eodem Cypriano praedicatur.  Cumque (hoc deplorandum est) a tyrannis pro Christo patienter tolerasset Sanctus Cyprianus illico rescripsit mortem extra unitatem Ecclesiae inflictam, non esse coronam Martyrii, sed perfidiae poenam.

 

Traduzindo a parte que está sendo referida no texto de A. Lima e também destacando-a, colocarei o restante do texto para mostrar que A. Lima omitiu algumas palavras interessantes (destacarei algumas):

 

II. Um Pontífice que caiu em heresia pode ser justamente deposto. Assim ensina Duvallius, conforme mencionado acima na questão 10. A razão é que não é crível que Cristo queira manter como Vigário de Sua Igreja alguém que se separa completamente dela com pertinácia, uma vez que Cristo especialmente ordenou à Sua Igreja que ouvisse Sua voz como povo fiel, e que obedecesse a Ele, assim como as ovelhas ouvem a voz do seu pastor. João 10:3: As ovelhas ouvem a Sua voz e O seguem. Versículo 4: As ovelhas O seguem. No entanto, longe de ser o caso de que a Igreja deva ouvir um Pontífice que caiu em heresia, Ela está obrigada a tapar Seus ouvidos contra seu discurso violento, para não ser infectada pelo veneno de sua doutrina, e sua deposição e uma nova eleição devem ser urgentemente promovidas pela assembleia dos Sagrados Cardeais.

A razão é que, sendo o Pontífice o fundamento da Igreja, a Pedra, a Pedra Angular, a Base, o Mestre e o Pastor Geral, sua heresia abole todos os seus privilégios e os cancela, porque ele se torna um destruidor e dispersor da Igreja e, consequentemente, já não é mais Pontífice. Ou, se ele ainda permanecer, até que seja judicialmente denunciado como herege, deve ser imediatamente deposto do Pontificado, se sua heresia for externa e manifesta por evidência factual ou por declaração de um Concílio. Mas não se a heresia for apenas interna e mental. A razão é que ele já não é mais membro da Igreja, nem seu chefe, nem está unido à Igreja internamente, pela fé, nem externamente, pela confissão da fé, estando assim cortado de ambos os modos. A mesma punição recai sobre o Pontífice que se torna cismático, conforme ensina Turrecremata, no livro 4, parte 1, capítulo 11 da "Suma da Igreja". E também Caetano, na segunda parte da segunda, questão 37, artigo 1, ensina que o cisma pode ser cometido de três formas. Primeiro, se ele não quiser mais exercer o ofício de Pontífice, nem desejar submeter-se a quem for eleito em seu lugar, mas se unir aos concílios dos cismáticos. Segundo, se ele quiser alterar os antigos ritos e costumes da Igreja que vêm da tradição apostólica, ou separar-se da unidade da Igreja que deseja manter essas cerimônias. Terceiro, se por uma causa injusta se separar da comunhão de toda a Igreja e de todos os Bispos, e desejar comunicar-se apenas com aqueles que o seguem, assim como fez Novaciano, que por isso foi chamado de cismático e, fora do seio da Igreja, foi amplamente condenado por São Cipriano. E, apesar de Novaciano ter suportado pacientemente a tirania por Cristo (o que é deplorável), São Cipriano prontamente respondeu que a morte infligida fora da unidade da Igreja não é uma coroa de martírio, mas a punição da perfídia.

 

Colocarei também a parte III, pois é interessante, destacando alguns trechos, quem quiser ver o texto completo, onde o padre Matthias de Corona falava do poder dos cardeais sobre o Papa, deixo o link aqui; https://www.franciscan-archive.org/misc/Tractatus-Postumus.html

 

III. Excetuando a heresia ou o cisma, o Papa não deve ser deposto por qualquer crime escandaloso e prejudicial ao estado da Igreja, mas deve ser advertido com humilde reverência pelos Cardeais e Príncipes, e repreendido por um Concílio Geral, mas de forma alguma deposto. Assim ensina Duval na questão 10, em conformidade com a melhor parte dos teólogos, contra Vigório. Isso é provado, primeiro, pelo Cânon "Nemo", cânon "Aliorum", cânon "Facta", 3ª questão 3, cânon "Licet" de eleições, cânon "Tantum", cânon "Nunc autem", distinção 21, cânon "Si Papa", distinção 40, e 2ª questão 7, cânon "Oves", cânon "Electionem", distinção 97. Nesses cânones, está estabelecido que a eleição dos Sumos Pontífices ou do sacerdócio foi reservada ao Senhor, embora Ele tenha concedido a eleição deles a bons sacerdotes e ao povo.

Em segundo lugar, nenhum Papa foi deposto ou julgado, exceto por heresia ou cisma. Que João XII e Bento V tenham sido expulsos por uma vida infame no Sínodo dos Provinciais é um fato contra os cânones e as leis, como observam Sigerberto e Oto de Frisinga.

Em terceiro lugar, Nicolau I relata ao imperador Miguel que o Papa Marcelino, com a maior desonra e escândalo para o povo cristão, por medo de punições, havia oferecido sacrifícios aos ídolos, e, após esse crime, foi ao Concílio de Sinuessa para ser julgado pelos Padres reunidos. A resposta dos Padres foi que a Sé Primacial não pode ser julgada por ninguém, mas somente por si mesma. Mesmo quando acusações foram feitas contra o Papa Símaco e houve grande controvérsia sobre seu julgamento, todos responderam que não tinham autoridade para emitir uma sentença contra o Sumo Pontífice, mas que deveriam entregar todo o caso ao julgamento de Deus.

Em quarto lugar, no Evangelho de Mateus, capítulo 23, versículo 2: "Os escribas e fariseus sentaram-se na cadeira de Moisés; façam e observem tudo o que eles vos disserem, mas não sigam os seus atos." Assim, qualquer que seja o crime cometido pelo Papa, exceto no caso de heresia, ele não deixa de ensinar corretamente. Portanto, ele não deve ser deposto por tal motivo.

Em quinto lugar, o oitavo Concílio Geral, sessão 7, aprova os decretos do Papa Adriano, que assim fala: "Lemos que o Pontífice Romano julgou os prelados de todas as Igrejas, mas nunca lemos que alguém tenha julgado o Pontífice Romano."

 

           Pois bem, por que A. Lima omitiu o restante do texto? Será que seus leitores não mudariam de ideia se lessem a parte faltante: “Ou, se ele ainda permanecer, até que seja judicialmente denunciado como herege, deve ser imediatamente deposto do Pontificado, se sua heresia for externa e manifesta por evidência factual ou por declaração de um Concílio.”?


           E quanto à parte no artigo III, sobre o caso de incorrer em cisma: “Segundo, se ele quiser alterar os antigos ritos e costumes da Igreja que vêm da tradição apostólica, ou separar-se da unidade da Igreja que deseja manter essas cerimônias.”?


Seus leitores não chegariam à conclusão do sedevacantismo? Os conciliares, com seus novos ritos, não incorrem em cisma, segundo o Padre Matthias? Suas heresias, externas e manifestas, que demoram a ser denunciadas judicialmente, não resultam na deposição imediata?

           Além disso, um livro do ano de 1677, em que São Roberto Belarmino ainda não era nem Doutor da Igreja e nem canonizado, apresentava-se várias opiniões na época, e a de Padre Matthias, ainda assim, nos favorece. No entanto, São Roberto Belarmino foi canonizado e proclamado Doutor da Igreja e das Controvérsias em 1930, justamente por seu livro onde trata a questão do Papa Herege, De Controversiis Christianae, refutando Caetano e superando também João de São Tomás, seu adversário posterior que defendia a opinião de Caetano. São Roberto Belarmino venceu e teve a predileção do Papa Pio XI e todos os teólogos mais modernos (até 1958); “Um Papa herege público e manifesto está DEPOSTO ipso facto”.


           Entretanto, A. Lima vai além e se transforma em teólogo, afirmando na página 207: “Com bom fundamento em tudo o que foi exposto até aqui, acreditamos que este seja mesmo o caso. Que São Roberto Belarmino enganou-se ao defender a quinta opinião em detrimento da quarta defendida pelo Cardeal Caetano.”


           Como assim São Roberto Belarmino, Doutor da Igreja e das Controvérsias, "enganou-se"? Baseado na opinião de um leigo, com o "acreditamos" e com textos recortados e adaptados?


Lamento pelos que abandonaram o sedevacantismo, a posição correta e verdadeira diante da atual "crise da Igreja" dos nossos tempos, por acreditarem no "acreditamos" do teólogo A. Lima, que, com seu livro, não só propõe uma refutação ao sedevacantismo, mas também a São Roberto Belarmino!

           Este artigo é apenas um aperitivo. Como eu disse, praticamente a cada página, há equívocos gritantes que será um grande prazer refutar e demonstrar a verdade.


           Sede Vacante.

 

Por Yuri Maria, 18 de Outubro de 2024, dia de São Lucas.

 

 

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